Artículo Original

Prevalência de Defeitos de Desenvolvimento de Esmalte em incisivos permanentes de escolares: estudo fotográfico no sul do Brasil

Renata Barbieri Bogo1; Judith Ángelica Gonzáles Sullcahuamán2; Fernanda de Morais Ferreira3; José Vitor Nogara Borges de Menezes4; Renato Cordeiro Gugisch5; Fabian Calixto Fraiz6

Resumo

O objetivo deste estudo foi verificar a prevalência e a distribuição dos diferentes tipos de defeitos de desenvolvimento de esmalte (DDE) em incisivos de escolares de um município de pequeno porte populacional do sul do Brasil. Foram examinadas todas as crianças / adolescentes que cursavam de 5ª à 8ª série do ensino fundamental na rede pública da cidade de Camboriú – SC cujas escolas aceitaram participar e cujos responsáveis individualmente consentiram na sua participação. Foram incluídos no estudo aqueles que apresentavam incisivos com pelo menos 3/4 da coroa irrompida e em condições de serem examinados (sem aparatologia ordodôntica, fratura, lesão cariosa ou restauração extensa; n = 223). Dois examinadores previamente treinados utilizaram o critério clínico da “FDI World Dental Federation” para o diagnóstico de DDE, através de imagens projetadas de fotografias dos incisivos. Análises descritivas e teste qui-quadrado foram realizados. 1728 dentes foram classificados quanto à presença de DDE. A prevalência de DDE foi de 34,1% entre os escolares, sendo que 10,3% dos dentes examinados apresentaram algum tipo de DDE. A prevalência das diferentes alterações entre os incisivos examinados foi: opacidade difusa (6,6%), opacidade demarca (3,4%) e hipoplasia (0,4%) e as classificações mais freqüentes foram opacidade difusa linear (3,7%), seguida de opacidade demarcada branca (3%) e opacidade difusa irregular (2,8%). Houve associação estatisticamente significante (p<0,001) entre a presença de DDE e a arcada dentária, sendo os incisivos superiores os mais afetados. Os incisivos centrais foram estatisticamente mais afetados (p<0,001) do que os laterais. Os incisivos inferiores apresentaram prevalência semelhante de DDE entre si. Não houve diferença estatisticamente significante na prevalência de DDE em função do gênero e do lado do dente. Conclui-se que a ocorrência de DDE em incisivos permanentes de escolares do sul do Brasil foi alta, assim é importante que o cirurgião dentista seja capaz de estabelecer seu diagnóstico e identificar os possíveis fatores etiológicos envolvidos.

Descritores: Esmalte dentário, Anormalidades dentárias, Dentição, Permanente; Prevalence; Hipoplasia do Esmalte Dentário.


Original article

Prevalence of development defects in permanent incisors enamel in school children: a photographic study in Southern Brasil

Abstract

The main goal of this study was to evaluate the prevalence and distribution of development defects of enamel (DDE) on incisors from schoolchildren from a southern Brazilian city. Schoolchildren attending from 5th to 8th grade on public schools from the city of Camboriu, state of Santa Catarina, whose parents agreed to sign the informed consents, participated on the study. Inclusion criteria: children which upper and lower incisors had at least ¾ of the crown erupted. Exclusion criteria: children under orthodontic treatment, fractured teeth, teeth with carious lesions or any kind of restorative material. 223 schoolchildren were examined. Two examiners, previously calibrated, used the FDI protocol to the DDE exams based on the projection of a photographic image of the upper and lower incisors. The statistical approach was carried out using descriptive analysis and the chi-square test. The results were as follows. The DDE prevalence was 34,1% and 10,3% of the teeth examined showed some kind of DDE. The prevalence of the different types of DDE were 6,6% for diffuse opacities, 3,4% for demarcated opacities and 0,4% for hypoplasias. The most frequent classifications were linear diffuse opacities with 3,7% followed by white demarcated opacities with 3% and irregular diffuse opacities with 2,8%. A statistical significant difference was found (p<0,001) when analyzing the presence of DDE and the dental arch, with the upper incisors being the most affected. The central incisors were most affected than the lateral ones (p<0,001). No statistical differences were found when analyzing gender or the side of the dental arch. The authors concluded that the prevalence of DDE’s on schoolchildren on a southern Brazilian city was high and the dentists should be able to make the correct diagnostic and define possible etiologic factors.

Key words: Dental Enamel; Tooth Abnormalities; Dentition, Permanent; Prevalence; Dental Enamel Hypoplasia.


  1. Cirurgiã Dentista, Especialista em Odontopediatria
  2. Aluna do Programa de Pós-graduação em Odontologia / Universidade Federal do Paraná
  3. Professora Adjunta da Disciplina de Odontopediatria, Universidade Federal do Paraná
  4. Professor Adjunto da Disciplina de Odontopediatria, Universidade Federal do Paraná
  5. Professor Associado da Disciplina de Odontopediatria, Universidade Federal do Paraná
  6. Professor Associado da Disciplina de Odontopediatria, Universidade Federal do Paraná

Introdução

O esmalte é considerado um marcador biológico, sensível a uma série de eventos e situações, sendo que a interpretação dos Defeitos de Desenvolvimento do Esmalte (DDE) pode ser um poderoso instrumento de diagnóstico, tanto de indivíduos como de populações. A observação de sua manifestação clínica, considerando sua localização, dentes envolvidos, extensão, coerência cronológica e simetria, aliada a um adequado levantamento da história de saúde do indivíduo, podem indicar se o defeito está associado a fatores sistêmicos ou locais e permitem a definição da época de ocorrência do evento causador.

Desta forma, os DDE têm sido utilizados como um indicativo de padrão de saúde em populações arqueológicas (Griffin, Donlon, 2009) e sua associação com a qualidade de vida apresenta cada vez mais evidências científicas, tanto nos aspectos gerais de uma determinada população incluindo os fatores socioeconômicos e nutricionais (Massoni,Chaves, Rosenblatt, Oliveira, 2007), quanto em situações específicas como, por exemplo, crianças com doença celíaca (Majorana, et al, 2010), asma (Guergolette et al, 2009), Tetralogia de Fallot (Assunção, 2008) ou histórico de infecções na infância (Arnadóttir, Sigurións, Holbrook, 2005).

Além disso, como existe uma clara associação entre traumatismos alveolodentais (Da Silva Assunção et al., 2009; do Espírito Santo Jácomo, Campos, 2009) e lesões periapicais nos dentes decíduos (Cordeiro e Rocha, 2005) com as alterações na formação do esmalte do dente permanente sucessor, é provável que a atenção odontológica adequada nos primeiros anos de vida diminua a possibilidade de alterações de esmalte em dentes permanentes.

Dentre os aspectos que alertam para a necessidade de estudos nesta área, destaca-se a possibilidade de utilização dos índices de DDE como um indicador do nível de qualidade de vida de uma determinada população, incluindo o nível de atenção odontológica. Outro indicador da importância do seu estudo e monitoramento é a possibilidade de adoção de medidas preventivas, já que existem poucos fatores etiológicos incontroláveis associados aos DDE, como é o caso de doenças genéticas. Mesmo nesta situação, o conhecimento é importante para o correto diagnóstico e resolução clínica (Gonzales-Pinedo, Perona-Miguel de Priego, 2009).

Assim este trabalho procurou verificar a prevalência e a distribuição dos diferentes tipos de defeitos de desenvolvimento de esmalte em incisivos de escolares de um município de pequeno porte populacional do sul do Brasil, o que permitirá o estabelecimento de estratégias de ações que visem sua prevenção, controle e monitoramento.

Metodologia

Após a aprovação do Comitê de Ética do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (CEP-HC 052EXT006/2002-04) e a au-

torização da Prefeitura Municipal de Camboriú, foi desenvolvido em 2002 um estudo transversal com uma população constituída por crianças e adolescentes, de ambos os gêneros, matriculados na rede pública de ensino da cidade de Camboriú, Santa Catarina, Brasil, um município com água de abastecimento fluoretada desde o ano de 1983. Para seleção dos escolares, foram adotados os seguintes critérios de inclusão: estar cursando entre a 5ª e a 8ª séries do ensino fundamental e possuir todos os incisivos centrais irrompidos, com exposição de pelo menos ¾ da coroa. Foram excluídos os escolares cujas escolas não quiseram participar ou cujos responsáveis não consentiram na sua participação, além daqueles cujos incisivos não se encontravam em condições de serem avaliados (em uso de aparatologia ordodôntica, com fratura, lesão cariosa ou restauração extensa). De acordo com estes critérios, foram examinadas 229 crianças e adolescentes de 3 escolas da rede pública.

Os exames para diagnóstico de DDE foram realizados através de fotografias dos incisivos das crianças. Antes de serem fotografados, os escolares receberam instruções de higiene bucal e realizaram escovação dentária sob supervisão direta dos examinadores para remoção de placa dental. As escovas e os dentifrícios utilizados foram doados às crianças.

Foram obtidas imagens dos incisivos com magnificação de 1:1 utilizando máquina fotográfica com lente de 100 mm e flash circular (Dental EYE® III Yashica) e filme Kodak® Ektachrome 100. As fotografias dentais foram realizadas sob luz natural no próprio pátio das escolas, por um fotógrafo posicionado à frente da criança. Foi utilizado abridor de boca com número de identificação visível no campo fotográfico e a criança foi instruída a manter uma relação em topo para os incisivos. Nome, número e idade da criança foram anotados em ficha específica.

Depois de processados, os diapositivos foram codificados e colocados em uma sequência aleatória, para garantir uma avaliação cega. Os diapositivos foram projetados, em sala escura sob tela branca, usando um equipamento Kodak® Ektagraphic III e visualizados em uma magnificação de 20 vezes a uma distância de aproximadamente 5 metros. Dois examinadores (FCF e JVNBM) previamente treinados observaram conjuntamente as imagens e anotaram em ficha própria a condição do esmalte da face vestibular de cada um dos incisivos. Em caso de discordância quanto à classificação, os conceitos eram revistos, nova classificação procedida e, se mantida a discordância, era anotada o menor índice.

Os códigos e critérios adotados foram os sugeridos pelo FDIWorld Dental Federation (COMISSION ON ORAL HEALTH, RESEARCH AND EPIDEMIOLOGY-FDI, 1992).

Os dados foram submetidos a análises descritivas e a associação entre a variável resposta DDE, dicotômica (presente/ausente) ou categorizada de acordo com as suas subclassificações, e as demais variáveis independentes foi avaliada pelo teste qui-quadrado através do programa Epi-Info versão 3.5.1. O nível de significância adotado foi de 5% (a=0,05).

Resultados

Das 229 crianças examinadas, seis foram excluídas devido a impossibilidade de determinação do índice (utilização de aparatologia ortodôntica fixa), resultando em um total de 223 crianças com idade média de 12,06 (±1,26) anos.

A prevalência de DDE na amostra estudada foi de 34,1%, ou seja, 76 crianças apresentaram pelo menos um incisivo com alguma alteração de desenvolvimento do esmalte, sem diferenças entre os gêneros (tabela 1).

Tabela 1.
Distribuição das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da prevalência de defeitos de desenvolvimento de esmalte e do gênero. 2002, n=223.
Figura 1. Distribuição das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da prevalência de
defeitos de desenvolvimento de esmalte e do gênero. 2002, n=223.

A tabela 2 apresenta as diversas classificações de DDE de acordo com os dentes. Foram fotografados 1832 dentes, sendo excluídos aqueles que estavam mal posicionados de forma a prejudicar a classificação ou cuja imagem estava desfocada, resultando em um total de 1728 incisivos avaliados, dos quais 10,3% foi diagnosticado com DDE (tabela 2). Os defeitos mais freqüentemente observados foram opacidade difusa linear (3,7%), opacidade demarcada branca ou cor de nata (3,0%) e opacidade difusa irregular (2,8%). Por sua vez, as alterações hipoplásicas foram as menos prevalentes. Os dentes mais acometidos foram os incisivos centrais superiores direitos (21,8%) e os menos acometidos foram os incisivos centrais inferiores direitos (4,7%).

Tabela 2.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, de acordo com a classificação de defeitos de desenvolvimento de esmalte. 2002, n=1728.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, de acordo com a classificação de defeitos de desenvolvimento de esmalte. 2002, n=1728.

Os incisivos centrais foram estatisticamente mais acometidos por DDE do que os incisivos laterais (p<0,001; Tabela 3). A prevalência destas alterações foi 1,84 vezes maior neste grupo de dentes. Considerando-se apenas os dentes superiores, a razão de prevalências entre incisivos centrais e laterais sobe para 2,27. Com relação à localização dos dentes, os incisivos superiores apresentaram uma prevalência de DDE 3,04 vezes maior do que os incisivos inferiores, e esta diferença foi estatisticamente significante (p<0,001). Já o lado do dente não influenciou de maneira significante a ocorrência de DDE (p=0,764; Tabela 3).

Tabela 3.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da prevalência de defeitos de desenvolvimento de esmalte e demais variáveis independentes. 2002, n=1728.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da prevalência de defeitos de desenvolvimento de esmalte e demais variáveis independentes. 2002, n=1728.
*Teste qui-quadrado. RP: Razão de prevalência. [IC95%]: Intervalo de confiança de 95%. #Se considerados apenas os incisivos superiores, os valores de RP e IC passam a ser 2,27 [1,61-3,21].

A tabela 4 evidencia a presença de associação estatisticamente significativa entre o grupo de dentes e o tipo de DDE (p=0,031). Embora a opacidade difusa tenha sido a alteração mais freqüente nos dois grupos de dentes, a prevalência de opacidade demarcada foi maior entre os incisivos centrais (37%) do que entre os incisivos laterais (18,3%) enquanto a prevalência de opacidade difusa foi maior entre os incisivos laterais (78,3%) do que entre os incisivos centrais (58,6%). A prevalência de hipoplasia foi semelhante nos dois grupos de dentes. O tipo de defeito apresentado pelo esmalte não sofreu influência da localização do dente (Tabela 4).

Tabela 4.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da classificação do defeito de desenvolvimento de esmalte apresentado e demais variáveis independentes. 2002, n=176#.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da classificação do defeito de desenvolvimento de esmalte apresentado e demais variáveis independentes. 2002, n=176#.
#Foram incluídos nestas análises apenas os dentes que apresentavam defeito de desenvolvimento de esmalte. *Teste qui-quadrado. Valores de “p” em negrito expressam diferença estatisticamente significante.

Por sua vez, a extensão na qual os dentes foram afetados pelos DDE foi semelhante entre incisivos centrais e laterais e entre incisivos direitos e esquerdos (Tabela 5). Contudo, os dentes superiores tiveram uma maior extensão da coroa afetada pelos defeitos de desenvolvimento do que os dentes inferiores. Enquanto 15,7% dos incisivos superiores acometidos apresentaram mais de 2/3 da superfície vestibular da coroa envolvida pelo DDE, apenas 2,3% dos incisivos inferiores apresentaram DDE com a mesma extensão, e esta diferença foi estatisticamente significante (p=0,041; Tabela 5).

Tabela 5.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da extensão do defeito de desenvolvimento de esmalte apresentado e demais variáveis independentes. 2002, n=176#.
Distribuição dos dentes incisivos das crianças escolares da rede pública da cidade de Camboriú, SC, em função da extensão do defeito de desenvolvimento de esmalte apresentado e demais variáveis independentes. 2002, n=176#.
#Foram incluídos nestas análises apenas os dentes que apresentavam defeito de desenvolvimento de esmalte. *Teste qui-quadrado. Valores de “p” em negrito expressam diferença estatisticamente significante.

Discussão

O estudo dos defeitos de desenvolvimento do esmalte (DDE) apresenta grande importância devido a maior susceptibilidade ao desenvolvimento de lesões cariosas (Hoffmann, de Souza e Cypriano, 2007), possível interferência na estética (Ellwood e O'Mullane, 1995a) e na imagem que o individuo faz de si próprio (Sujak, Kadir e Dom, 2004, Marshman, Gibson, Robinson, 2009). Além disso, são bons indicadores da qualidade de vida de uma determinada população, já que são intimamente associados à alterações sistêmicas, resultado do padrão de saúde e consequentemente das condições socioeconômicas.

Considerando sua importância, diversas pesquisas tem sido conduzidas, sendo que em boa parte os métodos de exame são exclusivamente clínicos presenciais. Neste estudo optou-se pela utilização de registro fotográfico de incisivos permanentes para o diagnóstico dos DDE. Esta abordagem foi adotada por questões práticas: requer pouco tempo com a criança e, conseqüentemente, na instituição de ensino, permitindo a realização do estudo sem grande interferência nas atividades escolares. Além disso, para estudos de DDE na região anterior, o método fotográfico tem demonstrado uma boa concordância com o método clínico (Ellwood; Côrtes, O’Mullane, 1996; Rugg-Gum, Al Mohamadi, Butler, 1997; Wong et al, 2005). Com relação ao exame exclusivo dos incisivos, embora esta estratégia não seja recomendável para avaliação de DDE na dentição decídua, que apresenta maior envolvimento dos dentes posteriores (Lunardelli e Peres, 2005), na dentição permanente é justificável por serem os incisivos os dentes mais afetados (Dummer et al 1986 b, Dummer et al 1986 a, Rugg-Gum, Al Mohamadi, Butler, 1997). Assim, pode-se considerar que a avaliação de dentes anteriores permanentes é um forte indicativo da manifestação dos DDE em uma determinada população.

Para a análise dos dados deve-se considerar que as DDE apresentam grande sensibilidade às condições de vida de cada população (Rugg-Gum, Al Mohamadi, Butler, 1997), sendo que a comparação entre estudos epidemiológicos deve ser cuidadosa, pois são esperadas diferenças entre as populações.

Neste estudo, realizado em população que recebe água fluoretada, observou-se uma alta prevalência de DDE quando considerado a unidade indivíduo (34,08% do total de crianças) ou a unidade dente (10,3% do total de dentes), tabelas 1 e 2. Parte dos resultados podem ser explicados pelo fato do índice utilizado incluir as alterações de esmalte promovidas pelo consumo de flúor. Comunidades que recebem água fluoretada apresentam uma maior prevalência de DDE quando avaliadas pelo este índice (Rugg-Gum, Al Mohamadi, Butler, 1997; Kanagaratnam et al, 2009). Contudo, Machiulskiene et al., em 2009, demonstraram que quando se excluem as lesões com características de fluorose do índice de DDE, a prevalência das alterações de esmalte diminuem em presença de água fluoretada.

No presente estudo, encontrou-se que o defeito mais prevalente foi opacidade difusa linear, seguido de opacidade demarcada branca ou cor de nata e opacidade difusa irregular (Tabela 2). Embora a opacidade difusa tenha sido a alteração mais freqüente, a prevalência de opacidade demarcada foi maior entre os incisivos centrais do que entre os incisivos laterais (Tabela 3). Este aspecto pode ser explicado pela associação entre opacidade demarcada e fatores locais como trauma ou lesões periapicais em dentes decíduos, aspectos para os quais os incisivos centrais são mais susceptíveis.

Os estudos indicam que a opacidade difusa está diretamente relacionada o consumo de flúor (Rugg-Gunn, Al Mohamadi, Butler, 1997), sendo o defeito mais comumente encontrado em populações com água de abastecimento fluoretada enquanto, em regiões sem ou com níveis baixos de flúor na água de abastecimento, o defeito mais freqüente é a opacidade demarcada (Dini et al, 2000, Ellwood, O’Mullane, 1995).

A ausência de diferença estatisticamente significante para prevalência dos defeitos de esmalte quanto ao gênero (Tabela 1) corrobora com diversos estudos (Hoffman et al 1988, King 1989, Crooks, 1990, Hoffmann, Sousa; Cypriano, 2007) onde esta variável não esteve associada à prevalência de DDE. Devido à ausência de diferenças significativas entre os gêneros, tem sido sugerido que na interpretação dos dados seja considerada a amostra total (King, Wei, 1986), atitude adotada nesse trabalho.

A literatura tem demonstrado que os dentes superiores são mais afetados que os inferiores (Dooland e Wyllie, 1989) em especial os incisivos centrais. A maior prevalência de DDE em dentes superiores e em incisivos centrais (Tabela 4) pode ser justificada devido à alta freqüência de trauma nos incisivos centrais decíduos (Mestrinho; Bezerra; Carvalho, 1998), sendo que Andreasen; Sundströn; Ravn (1971) afirmam que é de fácil compreensão que injúrias em dentição decídua afetem diretamente a dentição permanente pela íntima relação entre o ápice dos dentes decíduos e o germe dos permanentes. Em um amplo estudo, Da Silva et al, 2009, avaliando 623 dentes permanentes de crianças que sofreram traumas em dentes decíduos, observaram que os defeitos de desenvolvimento ocorreram em 20,2% dos dentes permanentes, sendo que a opacidade de esmalte branca ou marrom-amarela foi o distúrbio mais prevalente.

Com relação à extensão das lesões, a grande maioria apresentou alterações que não ultrapassaram 1/3 da superfície vestibular, sendo que os incisivos superiores foram os dentes onde houve lesões com maiores extensões, provavelmente por serem os mais expostos aos traumatismos (Tabela 5). Resultados semelhantes foram encontrados por Hoffmann, Cutress e Tomiki, 1988; Nunn et al. (1993) e Yusoff et al. (2008).

Os resultados deste trabalho permitem que estudos futuros possam monitorar as alterações de esmalte nesta comunidade, as quais apresentam especial importância já que estas entidades clínicas podem ser o reflexo tanto de mudanças na qualidade de vida (fatores nutricionais, violência, traumatismos) como de alterações no acesso ao flúor.

Conclusões

A prevalência de DDE na população estudada foi alta, com predominância das opacidades difusas. Os incisivos centrais superiores foram afetados com mais freqüência e maior gravidade. Este conhecimento sobre a prevalência e distribuição dos diferentes tipos de DDE contribuirá para o monitoramento das condições de saúde da população.

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Recebido: 08-07-2010
Aceito: 22-09-2010
Correspondência: fraiz@ufpr.br